Hexagrama 56 O Viajante
Hexagrama 56 O Viajante

Hexagrama 56 O Viajante

Após um período de abundância que pode trazer muitos problemas, inclusive estagnação, vem O VIAJANTE.

O Viajante

Seja o que for aquilo em que a grandeza se esgote, uma coisa é certa: perde seu lar. Por isso a seguir vem o hexagrama O VIAJANTE.” ¹

Nesse hexagrama o I Ching indica como o viajante deve agir para não cair no infortúnio: “O VIAJANTE, sucesso através do que é pequeno (…) Mantendo a quietude e aderindo à clareza.” ²

“Quando um homem está viajando e é, portanto, estrangeiro, deve evitar ser rude ou arrogante. Ele não dispõe de um grande círculo de relações e não deve, portanto, se vangloriar. É necessário ser cauteloso e reservado; desse modo evitará o mal. Se ele for atencioso com os outros, terá sucesso. O viajante não tem morada fixa, seu lar é a estrada. Por isso ele deve procurar se manter íntegro e firme, detendo-se apenas em lugares apropriados e tendo contato comente com boas pessoas.” ³

Se o viajante se ocupa de coisas banais, atrai sobre si a desgraça. Um viajante não deve se rebaixar ocupando-se de vulgaridades que encontra no caminho. Quanto mais humilde e indefesa for sua situação externa, tanto mais deve ele preservar sua dignidade interior. Pois um estrangeiro se engana ao julgar que, prestando-se a brincadeiras e ao ridículo, encontrará acolhida amigável. Isso só pode lhe acarretar desprezo e tratamento ofensivo.” ⁴

Uma vez que esse hexagrama, O VIAJANTE, remete ao hexagrama A QUIETUDE, acho interessante retomar a idéia de que A QUIETUDE é um dos hexagramas que mais indicam vestígios das práticas Alquimia Interna no I Ching.

No início do hexagrama A QUIETUDE há uma referência a essas práticas e uma nota explicativa: “Talvez as palavras do texto contenham indicações para a prática do yoga” ⁵. “O termo yoga aqui usado por Wilhelm no sentido estrito de sua etimologia, não devendo ser confundido com as várias correntes do pensamento indiano que são habitualmente designadas por esse mesmo termo. Yoga vem da raiz sânscrita Yug, que se referia à canga usada para juntar a parelha de bois. Yoga, portanto, significa um recurso ou meio de união.” ⁶

As fórmulas da Alquimia Interna ensinam a reconectar os canais por onde a energia cósmica passa no corpo, desobstruindo pontos estagnados e há clara indicação no I Ching sobre a necessidade da prática da meditação: “Portanto, a compreensão do Livro das Mutações decorre também do vínculo de uma concentração e meditação.” ⁸ 

Nesse artigo sobre o I Ching há também informações relevantes a respeito.

A descrição detalhada das práticas de Alquimia Interna nunca estiveram presentes no Livro das Mutações? Elas eram transmitidas apenas oralmente? Ou foram retiradas do I Ching ao longo dos anos por serem de difícil compreensão? São perguntas sem respostas. O fato é que um praticante de alquimia interna que não leu o I Ching não é capaz de entender com profundidade o que as fórmulas significam. Do mesmo modo, apenas lendo o I Ching você não vai conseguir colocar rigorosamente em prática o que é proposto sem contar com a ajuda das fórmulas milenares. A Alquimia Interna e o I Ching são inseparáveis.

“… para que se possa compreender, é necessário nos reportarmos ao diagrama conhecido como Ho T´u, o MAPA DO RIO AMARELO que, segundo a tradição, teve sua origem com Fu Hsi. Esse mapa mostra o desenvolvimento a partir dos números pares e ímpares dos cinco estados da mutação (Wu Hsing, em geral erroneamente chamados elementos)” ⁹ 

E o que os cinco estados de mutação ligados a origem I Ching tem haver com as fórmulas da Alquimia Interna?

As fórmulas da Alquimia Interna são meditações com indicações de movimentos internos. Essas meditações são essencialmente diferentes do que hoje entendemos por meditação no sentido de acalmar a mente. Na alquimia interna o objetivo não é o relaxamento, estamos o tempo todo ativos, trabalhando com a energia vital inerente ao corpo humano e ao cosmos. As fórmulas indicam então os movimentos necessários para acessar essa energia e utilizá-la.

No hexagrama A QUIETUDE há clara referência aos fundamentos da Alquimia Interna:

“Mantendo imóvel o quadril. Rigidez na região do osso sacro. Perigo. O coração sufoca.
Isso se refere a uma tranquilidade forçada. Procura-se dominar a agitação do coração por meio da violência. Porém, o fogo, ao ser abafado, transforma-se numa fumaça acre que vai asfixiando à medida que se espalha. Do mesmo modo, em exercícios de meditação e concentração não se deve procurar forçar os resultados.
” ¹¹ 

As fórmulas da Alquimia Interna relacionam os elementos ou estados da mutação aos órgãos, e o coração está ligado ao fogo. Uma tranquilidade forçada seria como abafar o fogo, gerando um grande incêndio e provocando asfixia. Nosso corpo não se deixa enganar.

As fórmulas da Alquimia Interna descrevem como fazer para equilibrar a intensidade do fogo no coração. E o grande mistério é que mesmo com as fórmulas em mãos, ainda que se tenha um bom instrutor, como o próprio I Ching esclarece: não se deve procurar forçar os resultados. Então ainda que se tenha a descrição exata do que se tem de fazer, é um processo, e a única certeza é que existe uma duração que não se corrompe. Como se trata de um trabalho interno é impossível fraudar.

¹ in I Ching: o livro das mutações, Hexagrama 56. O VIAJANTE, p. 487. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

² in I Ching: o livro das mutações, Hexagrama 56. O VIAJANTE, p. 488. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

³ in I Ching: o livro das mutações, Hexagrama 56. O VIAJANTE, p. 172. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

⁴ in I Ching: o livro das mutações, Hexagrama 56. O VIAJANTE, seis na primeira posição, p. 173. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

⁵ in I Ching: o livro das mutações, Hexagrama A QUIETUDE, p. 161. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

⁶ in I Ching: o livro das mutações, nota 59 da tradução brasileira, p. 157. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

⁷ WILHELM, RICHARD I Ching: o livro das mutações – tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm, 1923, p. 11, a história do livro das mutações. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

⁸  in I Ching: o livro das mutações, livro segundo, TA CHUAN – O GRANDE TRATADO (também denominado Comentário aos Julgamentos Anexos), primeira parte, capítulo XI – Sobre as varetas de caule de milefólio, os hexagramas e as linhas, p. 243. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

⁹ in I Ching: o livro das mutações, Sobre o oráculo, p. 236. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.

¹¹ in I Ching: o livro das mutações, Hexagrama A QUIETUDE, nove na terceira posição, p. 163. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.


Sobre Qi Gong
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