O I Ching: o livro das Mutações é uma obra que transmite exuberante sabedoria.
“O I Ching é uma obra cuja maturidade é fruto de um crescimento orgânico realizado durante milênios.” ¹ (WILHELM, 1984)
Sua origem milenar se mistura com a mitologia e é atribuída a Fu Hsi, um herói mitológico da China Antiga que teria ensinado a caçar, a pescar e cozinhar: “no caldeirão cozinham-se os alimentos até que estejam prontos”.
“O fato de Fu Hsi ser indicado como o inventor dos signos lineares do I Ching, significa que lhes é atribuída uma tal antiguidade que antecede à memória histórica.” ² (WILHELM, 1984)
Ao longo dos anos foram acrescentados comentários ao texto mais antigo do I Ching. Inclusive, “o termo “Ching”, “Livro ou Clássico”, só foi adicionado ao título “I” (Mutações) no período confucionista”. Rei Wen, Duque de Chou e Confúcio contribuíram para compreensão do livro das mutações. Os Comentários aos Julgamentos Anexos, TA CHUAN, por exemplo, “contém um significativo acervo de tradições da escola confucionista, procedente de diferentes épocas” ³:
“Que fazem as mutações? As mutações desvelam coisas, completam os assuntos e abrangem todos os caminhos sobre a terra. Isso e nada mais elas fazem. Por isso, os santos e sábios as utilizavam para penetrar todas as vontades sobre a terra e para determinar todos os campos de ação sobre a terra e para resolver todas as dúvidas sobre a terra. (…)
Como esses sábios conheciam igualmente as leis que regem o curso do universo e aquilo de que os homens carecem, inventaram o uso das varetas oraculares – essas são as “coisas divinas” -, de modo a preencher as necessidades dos homens. Por isso, concentravam-se em santa meditação, dando à natureza, a força e a plenitude necessárias para atingir esse fim. Portanto, a compreensão do Livro das Mutações decorre também do vínculo de uma concentração e meditação.” ⁴
A conexão com o a energia oracular é realizada através da suavidade por um praticante de meditações e técnicas milenares transmitidas por monges do passado que optaram por viver isolados em cavernas ao invés de se juntarem aos templos religiosos. Oito sábios teriam sido os primeiros a experimentar e difundir o que hoje conhecemos por alquimia interna, Nei Dan ou Neigong.
Dependendo da qualidade da prática de quem joga, é possível solucionar grandes problemas com a ajuda do livro das mutações. A consulta tradicionalmente é realizada num jogo com cinquenta varetas de milefólio e para iniciar é preciso contextualizar uma situação e realizar uma pergunta.
Com frequência temos dificuldade em formular apenas uma pergunta, mas é importante que consigamos nos focar numa pergunta precisa e inclusive escrevê-la para que não haja dúvidas no momento de consultar a resposta.
O oráculo revela o que precisa sair do obscurantismo, por mais difícil que seja de enxergar.
O resultado do jogo indica um hexagrama, e ele “serve para determinar o campo de ação. As diferentes linhas do hexagrama são móveis ou mutáveis, de modo a dar informações e resolver as dúvidas relativas a situações particulares.” ⁵
“Nas mutações há imagens que visam a revelar; há julgamentos anexos que visam a interpretar; determina-se a boa fortuna ou o infortúnio, visando a decidir” ⁶
“As mutações são concebidas aqui como um processo natural, praticamente idêntico à vida. A vida depende da polaridade entre a atividade e a receptividade. Assim é mantida a tensão que, em cada ajustamento em busca de equilíbrio, se manifesta como a mutação, o processar-se da vida. Se esse estado e tensão, essa “diferença de nível” cessasse, não haveria mais nenhum padrão para a vida, que então não mais poderia se manifestar.”⁷
“O SHUO KUA – DISCUSSÃO DOS TRIGRAMAS, contém um material de grande antiguidade, destinado à explicação dos trigramas fundamentais“⁸:
“Os santos sábios da antiguidade compuseram o Livro das Mutações da seguinte maneira: para ajudar de modo misterioso os Deuses Luminosos, eles inventaram o oráculo de caules de milefólio. Contemplaram as mutações na escuridão e na luz e de acordo com elas estabeleceram os hexagramas. Provocaram movimentos no firme e no maleável, dando origem assim, às diferentes linhas. Colocando-se em harmonia com o Tao e a Vida estabelecendo, e acordo com isso, a ordem do que é correto. Refletindo sobre a ordem do mundo externo até as últimas consequências e explorando a lei de sua própria natureza interna em seu núcleo mais profundo chegaram à compreensão do destino.
(…)
Mas além de sua utilização como oráculo, o Livro das mutações possibilita também a compreensão intuitiva das condições do mundo e um aprofundamento até os níveis mais essenciais da natureza e do espírito. Os hexagramas representam imagens completas das condições e relacionamentos do mundo como um todo. As diferentes linhas tratam das mutações que ocorre em situações específicas no interior dessas condições gerais. O livro das mutações está em harmonia com o Tao e a Vida (Tao, a lei natural, e Te, a lei moral). Por isso o livro pode estabelecer as normas quanto ao que é próprio e adequado a cada homem. Mergulhando até as profundezas das derradeiras origens tanto no plano das experiência externa (natureza) quanto no da interna (espírito), o homem pode chegar à descoberta do destino, do sentido último do mundo tal como este realmente é, tal como veio a ser, em virtude de uma decisão criadora.”⁹
¹ WILHELM, RICHARD I Ching: o livro das mutações – tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm, 1923, p. 199, livro segundo, introdução. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
² WILHELM, RICHARD I Ching: o livro das mutações – tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm, 1923, p. 10, a história do livro das mutações. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
³ in I Ching: o livro das mutações, livro segundo – introdução, p. 201 e p. 245. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.(p. 201)
⁴ in I Ching: o livro das mutações, livro segundo, TA CHUAN – O GRANDE TRATADO (também denominado Comentário aos Julgamentos Anexos), primeira parte, capítulo XI – Sobre as varetas de caule de milefólio, os hexagramas e as linhas, p. 242 e 243. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
⁵ in I Ching: o livro das mutações, livro segundo, TA CHUAN – O GRANDE TRATADO (também denominado Comentário aos Julgamentos Anexos), primeira parte, capítulo XI – Sobre as varetas de caule de milefólio, os hexagramas e as linhas – 2, p. 242. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
⁶ in I Ching: o livro das mutações, livro segundo, TA CHUAN – O GRANDE TRATADO (também denominado Comentário aos Julgamentos Anexos), primeira parte, capítulo XI – Sobre as varetas de caule de milefólio, os hexagramas e as linhas – 9, p. 245 Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
⁷ in I Ching: o livro das mutações, livro segundo, TA CHUAN – O GRANDE TRATADO (também denominado Comentário aos Julgamentos Anexos), primeira parte, capítulo XII – Síntese – 3, p. 247. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
⁸ WILHELM, RICHARD I Ching: o livro das mutações – tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm, 1923, p. 202, livro segundo, introdução. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
⁹ in I Ching: o livro das mutações, livro segundo, SHUO KUA – DISCUSSÃO DOS TRIGRAMAS, p. 203 e 204. Tradução do chinês para o alemão, introdução e comentários Richard Wilhelm. Tradução para o português Alayde Mutzenbecher e Gustavo Alberto Corrêa Pinto. São Paulo: Editora Pensamento, 2006.
NOTAS:
Sobre Richard Wilhelm https://pt.wikipedia.org/wiki/Richard_Wilhelm
Link para um artigo relacionado https://meditartransmutar.com/desenvolvimento/
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